“Atitudes egoístas assim resultam em movimentos como os que estamos
vivendo.
Todo mundo quer que as coisas se resolvam...”
P.C.
EU FAÇO A
MINHA PARTE!
Pawlo Cidade*
Um dia, a floresta pegou fogo. Apavorados,
os animais corriam de um lado a outro. Um beija-flor que sobrevoava o local ao
ver o desespero dos bichos voou para o rio e trouxe em seu bico um pouco d´água
e jogou sobre o incêndio. Fez isso inúmeras vezes, mas, o fogo crescia cada vez
mais. Um leão, vendo a coragem do pequeno pássaro gritou para ele:
- Beija-flor você não vai conseguir sozinho apagar o
fogo.
O beija-flor não gostou da atitude
do leão, esperava que, ao invés de reclamar, ele pudesse ajudá-lo. Assim
retrucou:
- Pelo menos estou fazendo a minha parte!
Muitos de vocês já devem ter
ouvido esta história. E até concordaram com a atitude do beija-flor ou até
mesmo do leão. Fazer a nossa parte pode até ser uma saída. Já pensou se cada
comerciante da Jorge Amado, da Araújo Pinho ou de qualquer outra artéria da
cidade limpasse a frente do seu estabelecimento? Se cada cidadão ilheense
colocasse o lixo no horário da coleta ou descartasse pequenos objetos na
lixeira? Todos estariam fazendo a sua parte. Sobretudo em momentos de crise
como a que estamos vivendo, as ruas estariam limpas e os garis serviriam apenas
para recolher o acumulado. Acredito até que muitos estão fazendo isso.
Entretanto, não é possível mais
fazer apenas a nossa parte. Considero esta atitude paradoxalmente egoísta.
Quando você faz apenas a sua parte você está querendo dizer que cada um “fique
na sua e a amizade continue.” Que ninguém se meta na sua vida, no seu negócio,
na sua família. Atitudes egoístas assim resultam em movimentos como os que
estamos vivendo. Todo mundo quer que as coisas se resolvam, que cheguem a um
denominador comum. Ninguém quer motim, confusão, sedição, greve, ônibus
queimado, comércio parado, bancos sem funcionar, professores fora da sala de
aula, funcionários aborrecidos, mato na calçada, buracos.
Este paradigma “fazer a nossa
parte” está ultrapassado. Não adianta fazê-la e outro não fazer. Vale à pena
apagar a luz e o outro acender? Vale à pena limpar e o outro sujar? Não. A não
ser que o propósito seja este: deixar a porta aberta para o ladrão entrar. Ou ainda
fechar a porta depois que o ladrão roubou.
Eu acredito que “além de fazer a
nossa parte” nós precisamos convencer o outro a fazer a dele também. Então, não
basta fazer, é preciso que o outro compreenda que se ele fizer, não
precisaremos fazer o mesmo trabalho duas vezes ou solitariamente. Porém, nada
disso tem resultado se exigirmos aquilo que nós mesmos não fazemos. Como ser
exemplo se você é o primeiro a sujar? Como ser exemplo se você é o primeiro a
falar mal do seu vizinho? Como ser exemplo se você, que faz parte do governo,
não acredita no próprio governo? Está desgostoso, inquieto, sem vontade de
contribuir, dê o lugar para quem quer. Vá embora. Destranque o ferrolho, pegue
o caminho da gruta, mas não cuspa no prato que está comendo. Ou você faz parte
da categoria dos animais que usam a lama para tomar banho?
O beija-flor percebeu que havia
dado uma resposta grosseira para o leão. Pensando em se desculpar e, ao mesmo
tempo, convencê-lo de que estava fazendo a coisa certa, disse:
- Leão, a floresta é o meu lar, o
seu lar, o nosso lar. Se ela morrer, eu morreria porque não terei mais flores
para sugar-lhe o néctar e você não terá mais onde caçar. Apesar de estar no
alto, preciso dela tanto quanto você.
- É verdade. Você tem razão. Também vou ajudá-lo.
– E o leão correu até o rio e pegou água com a boca. O elefante vendo aquilo
pegou água com a tromba. Outros animais começaram a pegar água como podiam. Os
tatus cavaram buracos até próximo o fogo e parte do leito do rio inundou os
buracos e saiu perto do incêndio. No final da tarde, a floresta estava salva. O
fogo foi apagado.
Eis o novo paradigma: “fazer a sua
parte e convencer o outro a fazer a dele também.”
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