terça-feira, 28 de junho de 2016

PENSANDO A GESTÃO


“O conselho tem uma função importante, mas dentro de uma ideia de socialização do poder, não de governabilidade, mas de governança em determinada área”.
Francisco Ferron[1]


O PAPEL DO CONSELHEIRO DE POLÍTICA CULTURAL
Pawlo Cidade*


Uma coisa é descrever as características de um Conselho de Cultura para entendermos como é feita sua composição. Assim, ficamos sabendo se tem maioria da Sociedade Civil ou do Poder Público ou se é paritário; se seu caráter é fiscalizador, normatizador, deliberativo ou consultivo e como se dá o processo de escolha de seus integrantes.

Outra coisa - bem diferente - é o papel do conselheiro frente ao conselho. Que postura, atitudes e posicionamentos devem tomar aqueles que são escolhidos pela Sociedade Civil ou indicados pelo Poder Público para representar um determinado segmento cultural ou governamental? O que, de fato, se espera de um conselheiro de política cultural?

Vamos tentar responder estas questões.

Entretanto, a princípio, parece muito mais fácil definir as atribuições do conselho, a exemplo de acompanhar e avaliar a execução de programas e projetos; propor, avaliar e referendar projetos culturais; elaborar e aprovar planos de cultura; pronunciar-se e emitir parecer sobre assuntos culturais; fiscalizar as atividades do órgão gestor da cultura; fiscalizar o cumprimento das diretrizes e financiamento da cultura; fiscalizar atividades de entidades culturais conveniadas e administrar o fundo de cultura que compreender o verdadeiro e real significado do papel do conselheiro de política cultural. Com isso não estamos excluindo suas atribuições ou relegando-as à segundo plano.

Pelo contrário, se vincularmos estas atribuições – classificadas de forma crescente pelo Anuário de Estatísticas Culturais de 2010, publicado pelo Ministério da Cultura - à condição indispensável de caminharem, paralelamente, ao papel a ser desempenhado pelo membro do conselho de política cultural, este receberá outro significado. Sem dúvida, conditio sine qua non. Sem a qual, conselheiro nenhum dos 5 570[2] municípios brasileiros poderão exercer.

Alguns estudiosos e pesquisadores do tema, ou até mesmo um dicionário poderá afirmar que papel e atribuição têm o mesmo significado. Todavia, se entendermos que “papel” requer uma atitude de compromisso muito mais engajada, muito mais responsável, muito mais respeitosa com o comportamento social, ele ganha uma conotação diferente do conceito de “atribuição”. Embora esta esteja ligado àquela. Não se trata de um paradoxo porque se entendermos, também, atribuição como função, ela estará apensada ao conceito de papel, aumentando ainda mais as atitudes que o conselheiro deve executar.

Papel é um termo que provém do latim papýro (papiro), pelo catalão papel. O conceito está associado à função desempenhada por alguém ou por algo. O papel aqui desempenhado pelo conselheiro de cultura está próximo do conceito de “papel social” proposto pelas ciências sociais. Papel Social seria então um “conjunto de comportamentos e normas que uma pessoa enquanto ator social, adquire e apreende de acordo com o seu estatuto na sociedade. Trata-se, portanto, de uma conduta esperada de acordo com o nível social e cultural dentro da instituição, (grifo meu). Posto isto, o papel social é a aplicação de um estatuto que é aceite e desempenhado pelo sujeito”.

Quando o indivíduo passa a fazer parte do Conselho de Cultura, por exemplo, seu papel é conquistado a partir do resultado de um processo de convivência e socialização com os demais conselheiros. Apesar do escolhido ou indicado trazer consigo uma herança cultural – e por que não dizer também social - de seu segmento. Se bem que, muitas e muitas e muitas vezes não traz. Apenas ocupa espaço.

Ora, à medida em que o sujeito colabora com o conselho, ele está desempenhando o que se espera dele, já que suas atribuições lhe foram previamente apresentadas. É fato que de um pedreiro se espera que ele possa, pelo menos, erguer uma parede com tijolos e cimento. De um conselheiro espera-se que ele cumpra a lição de casa: fiscalize.

No entanto, não fiscalizar somente a as instâncias governamentais como a Secretaria de Cultura e todos os seus programas e projetos. Nem tampouco somente os instrumentos do Sistema Municipal de Cultura, a exemplo do Fundo de Cultura e do Plano Municipal de Cultura. E sim toda e qualquer atividade cultural do Município, inclusive as grandes festas populares como Carnaval, Réveillon e São João.

Do conselheiro espera-se que ele defenda a primazia da coletividade, em detrimento dos interesses individuais. Espera-se mais: que seu comportamento e suas ações apontem sempre para o fortalecimento da arte e da cultura. Que sua luta seja pela transparência, pela honestidade, pelo acesso, pela acessibilidade, pela descentralização das atividades culturais e dos recursos para estas mesmas atividades.

Um conselheiro de cultura é aquele que vê oportunidade onde o Poder Público enxerga problema. E não importa se ele representa uma classe, uma categoria, um movimento ou até mesmo uma associação, seja ela das culturas populares tradicionais e hereditárias ou dos produtores culturais. Sua bandeira, sua única bandeira deve ser sempre em benefício de todos.

Isto é o que chamamos de papel do conselheiro de política cultural.





[1] Ex-gerente do SESC Campinas, membro do Fórum Intermunicipal de Cultura (FIC), de São Paulo.
[2] Cinco novos municípios foram instalados no país no dia 1º de janeiro de 2013. Pescaria Brava e Balneário Rincão, em Santa Catarina; Mojuí dos Campos, no Pará; Pinto Bandeira, no Rio Grande do Sul; e Paraíso das Águas, no Mato Grosso do Sul eram distritos e foram emancipados depois que a população aprovou o desmembramento. Desta maneira, segundo o IBGE, o Brasil passa a ter 5.570 municípios.

* Escritor, produtor cultural, aluno do Curso de Especialização em Gestão Cultural da Universidade Estadual de Santa Cruz. 

Este texto é parte integrante de um trabalho sobre Conselhos Municipais de Cultura na Prática que deverá ser disponibilizado em 2017.

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